O HOLOCAUSTO BRASILEIRO

Ah... Meu pessimismo e ateísmo estavam, vamos dizer, arrefecidos... Coube à "cordialidade" do brasileiro acordá-los. Barbacena nunca mais!

Leituras que fortalecerão o nosso pessimismo.

  • "As Intermitências da Morte" de Saramago
  • "Os Ratos" de Dyonélio Machado

10.8.10

"Vivemos hoje a era que foi inaugurada por Hiroshima."

As bombas desejam explodir
Arnaldo Jabor
Bom Dia Jornal – 10/08/2010

            Há 65 anos, em 6 e 9 de agosto de 1945, os americanos destruíram Hiroshima e Nagasaki. Todo ano me repito e escrevo artigos parecidos sobre a bomba nessa data, não para condenar um dos maiores crimes da humanidade, não, mas para lembrar que o impensável pode acontecer a qualquer momento.
            Agora, não temos mais a guerra fria. Ficamos com a guerra quente do deserto – a mais perigosa combinação: fanatismo religioso e poder atômico. Vivemos dois campos de batalha sem chão; de um lado a cruzada do Ocidente, apesar e além de Obama. Do outro lado, temos os homens-bomba multiplicados por mil. E eles amam a morte.
            Hoje, já há uma máquina de guerra se programando sozinha e nos preparando para um confronto inevitável no Oriente Médio. Estamos num momento histórico onde já se ouvem os trovões de uma tempestade que virá. Os mecanismos de controle pela “razão”, sensatez, pela “soft powers” da diplomacia perdem a eficácia.
            Como dar conta da alucinação islâmica religiosa com amor à morte, do Paquistão, Índia, Israel, do Irã dominado por ratos nucleares em breve, da invencibilidade do Afeganistão, com a hiper-direita de Israel com Bibi, com o Hamas ou o Hellzsbolah que querem impedir o “perigo da paz”?
            “There is a shit-storm coming” – disse Normam Mailer uma vez.
            Tudo leva a crer que algo terrível acontecerá. A crença na razão ocidental foi ferida por dois desastres: o “11 de setembro” e a invasão do Iraque. A caixa de Pandora que Bush abriu nunca mais se fechará.
            Estamos às vésperas de uma bruta mudança histórica. Sente-se no ar o desejo inconsciente por tragédias que pareçam uma “revelação”. Surge a fome por algo que ponha fim ao “incontrolável", a coisa que o ocidente mais odeia. Mesmo uma catástrofe sangrenta parecerá uma “verdade” nova.
            Vivemos hoje a era que foi inaugurada por Hiroshima.
            Lá, e em Nagasaki, três dias depois, inaugurou-se a “guerra preventiva” de hoje. Enquanto o holocausto dos judeus na Segunda Guerra fecha o século 20, o espetáculo luminoso de Hiroshima marca o início da guerra do século 21. O horror se moderniza, mas não acaba.
            Auschwitz e Treblinkas ainda eram “fornos” da Revolução Industrial, eram massacres “fordistas”, mas Hiroshima inventou a guerra tecnológica, virtual, asséptica. A extinção em massa dos japoneses no furacão de fogo fez em um minuto o trabalho de meses e meses do nazismo.
            O que mais impressiona na destruição de Hiroshima é a morte “on delivery”, “de pronta entrega”, sem trens de gado humano, morte “clean”, anglo-saxônica. A bomba americana foi considerada uma “vitória da ciência”.
            Os nazistas matavam em nome do ideal psicótico e “estético” de “reformar” a humanidade para o milênio ariano. As bombas americanas foram lançadas em nome da “razão”. Na luta pela democracia, rasparam da face da terra os “japorongas”, seres oblíquos que, como dizia Truman em seu diário: “São animais cruéis, obstinados, traidores.” Seres inferiores de olhinhos puxados podiam ser fritos como “shitakes”.
            A bomba-A agiu como um detergente, um mata-baratas. A guerra como “limpeza”,  o típico viés americano de tudo resolver, rápida e implacavelmente... E continua aí, cozinhando na impaciência dos generais israelenses e nos falcões do Pentágono.
            A destruição de Hiroshima foi “desnecessária” militarmente. O Japão estava de joelhos, querendo preservar apenas o imperador e a monarquia. Diziam que Hitler estava perto de conseguir a bomba – o que é mentira.
            Uma das razões reais era que o presidente e o falcões da época queriam testar o brinquedo novo. Truman fala dele como um garoto: “Uau! No teste, fez uma torre de aço de 60 metros virar um sorvete quente!...” O clima era lúdico e alucinado... tanto que o avião que largou a bomba-A em Hiroshima tinha o nome da mãe do piloto na fuselagem – “Enola Gay” – esse gesto de carinho derreteu no fogo 150 mil pessoas. Essa foi a mãe de todas as bombas, parindo um feto do demônio, exterminando 40 mil crianças em 15 segundos.

9.8.10

A ROSA COM CIRROSE




Rosa de Hiroshima

Ney Matogrosso

Composição: Vinícius de Moraes / Gerson Conrad
Pensem nas crianças
Mudas telepáticas
Pensem nas meninas
Cegas inexatas
Pensem nas mulheres
Rotas alteradas
Pensem nas feridas
Como rosas cálidas
Mas, oh, não se esqueçam
Da rosa da rosa
Da rosa de Hiroshima
A rosa hereditária
A rosa radioativa
Estúpida e inválida
A rosa com cirrose
A anti-rosa atômica
Sem cor sem perfume
Sem rosa sem nada

LITTLE BOY: HIROSHIMA; FAT MAN: NAGAZAKI

Não me esqueci de Hiroshima e Nagasaki


Os sobreviventes do inferno de Hiroshima e Nagasaki
HIROSHIMA, Japão — Três dias após o lançamento de uma bomba americana sobre Hiroshima, a pequena Kazuko Uragashira, de 6 anos, e sua família fugiram, num trem, da fornalha em que se transformou a cidade arrasada na manhã de 6 de agosto de 1945.
Conseguindo milagrosamente sobreviver ao inferno nuclear, a família queria encontrar abrigo na casa de um tio situada em Nagasaki. Ignorava, então, que um novo encontro com o destino a esperava.
Kazuko lembra-se de estar sentada num banco do trem, as pernas queimadas pelo sopro radioativo, quando a composição parou de repente num túnel na entrada de Nagasaki.
Era um pouco mais de 11H00 deste 9 de agosto: a segunda bomba atômica da história acabava de ser largada pelo exército americano sobre Nagasaki. "Era o inferno de novo", conta a sra. Uragashira, 65 anos depois.
Enquanto o comboio abria caminho penosamente através da carnificina, a menina descobria sobreviventes, com a pele queimada soltando-se em pedaços dos corpos mutilados. "Lembro-me ainda do odor da carne queimada e dos gritos dos moribundos pedindo água... não esquecerei jamais".
A sra. Uragashira, que mora hoje numa ilha ao largo de Nagasaki, faz parte dos raros "niju hibakusha" ainda vivos, sobreviventes do inferno causado pelos dois bombardeios atômicos da Segunda Guerra Mundial.
"Tive essa chance, porque muitos outros morreram instantâneamente. Mas gostaria de entender o por quê de uma coisa tão horrível ter-me acontecido duas vezes."
Cerca de 140.000 pessoas morreram em Hiroshima, no momento mesmo da explosão, ou das consequências das queimaduras e da radiação, e mais de 70.000 em Nagasaki.
Estima-se em cerca de 150 o número de pessoas que, como a sra. Uragashira foram expostas a duas deflagrações.
O cineasta Hidetaka Inazuka registrou os depoimentos desses "niju hibakusha", de 75 anos, em média, para guardar essa parte de sua memória.
No momento em que muitos americanos continuam a pensar que as bombas atômicas eram necessárias para acelerar o fim da guerra, Inazuka, como numerosos japoneses, estima que esses ataques foram injustificados, porque o Japão estava prestes a capitular.
"Hiroshima foi totalmente destruída, o que teria sido mais do que suficiente", comenta. "Devemos examinar com cuidado os motivos pelos quais foram lançadas em duas cidades."
Muitos "hibakusha" - sobreviventes de um ataque atômico - ficaram muito tempo em silêncio, temendo por eles mesmos e seus descendentes de serem alvo de discriminação, mas começam, hoje, a contar suas lembranças dolorosas.
"Nunca disse que era uma +hibakusha+ porque pensava que ninguém quereria me esposar", conta Misako Katani, 80 anos, que sobreviveu aos dois bombardeios.
"Havia cadáveres espalhados por toda a cidade", conta ela sobre Hiroshima. "Alguns estavam sem a pele, com os ossos à mostra, e outros inchados pela chuva negra."
Ela se lembra também de sua irmã de 14 anos, que teve o corpo como que xerocado na parede da casa familiar, onde também jaziam os restos de sua mãe.
A sra. Katani encarregou seu pai de transportar as cinzas ao túmulo da família em Nagasaki. A segunda deflagração deixou-a em coma durante três dias, fazendo-a perder todos os cabelos.
"As bombas atômicas destruíram minha vida", conta ela.
Os Estados Unidos nunca pediram desculpas ao Japão por essas vítimas inocentes.